PEDIDOS DE FERROVIAS POR AUTORIZAÇÃO JÁ ALCANÇAM 8,4 MIL KM E R$ 117 BILHÕES EM INVESTIMENTOS

Dimmi Amora e Tales Silveira, da Agência iNFRA

O Ministério da Infraestrutura já analisa 27 solicitações de autorização para construção de novas ferrovias no país. A informação foi dada pelo diretor do Departamento de Ferrovias do Ministério da Infraestrutura, Ismael Trinks, durante Fórum Marco Ferroviário, realizado ao longo da última quinta-feira (11), promovido pela Conceito Seminários.

No encontrou, os servidores do Ministério da Infraestrutura fizeram forte defesa da proposta de autorizações ferroviárias que está presente na Medida Provisória 1.065 e no PL 3.754/2021, em avaliação pela Câmara dos Deputados após aprovação pelo Senado, agora sob relatoria do deputado Zé Vitor (PL-MG).

Mas, no encontro, foram também apresentados os principais desafios que terão que ser enfrentados pelos agentes públicos para regulamentar a proposta, fazer a transição com as atuais concessionárias e efetivamente tirar do papel as novas ferrovias solicitadas.

Até a semana passada, já eram 27 pedidos encaminhados ao ministério. Esses pedidos somariam R$ 117 bilhões em investimentos para a implantação de 8,4 mil quilômetros de ferrovias. O Ministério da Infraestrutura já tinha dado aval para início de análise de 25 deles.

O mais recente foi feito pela Macro Desenvolvimento Ltda, para construção e operação de ferrovia entre os municípios de Sete Lagoas (MG) e Anápolis (GO), com 716 quilômetros de extensão e estimativa de investimento de R$ 15,34 bilhões. O trecho começaria na Ferrovia Norte-Sul e seguiria em direção a outras ferrovias que a empresa já solicitou e vão na direção de portos no Espírito Santo.

Ainda foram protocolados mais dois projetos por outras pessoas jurídicas, um de estrada de ferro e outro de terminal intermodal (pátio ferroviário). Um deles é de uma empresa chamada Zion Real State Ltda para uma ferrovia de 153 quilômetros de extensão. 

O dado pode ser visto numa dos slides apresentados pelo diretor do departamento ferroviário. Mas o ministério informou que só divulgará os dados após as duas empresas completarem os documentos a serem apresentados.

400 anos
Na defesa do projeto de autorização, Trinks apresentou cálculo mostrando que, se o governo fosse fazer a concessão desse número de ferrovias, o tempo necessário seria de pelo menos 20 anos. Já para construir a mesma extensão com recursos públicos, o prazo seria de entre 100 anos e 400 anos, a depender da quantidade de recurso anual no orçamento para essa finalidade.

Trinks contou que o ministério ficou surpreso com a quantidade de pedidos, já que estimava apenas seis pedidos quando editou a medida provisória. Segundo ele, com esses seis trechos, as estimativas indicavam que o país poderia chegar a ter 35% de uso de ferrovia na matriz de transportes em 2035 (o percentual atual é de 20%). O diretor garantiu que, em um mês, já vão ser feitas as primeiras autorizações.

Marcos Kleber Félix, assessor especial do Ministério da Infraestrutura que está responsável pelo projeto de autorizações ferroviárias, também defendeu a proposta, dizendo que é a forma de "tirar do marasmo" o setor ferroviário, que não cresce há mais de um século. Segundo ele, é impossível ao estado planejar todas as necessidades do mercado.

Félix lembrou ainda que construir mais ferrovias vai ampliar a competitividade, apostando em melhoria dos serviços e menores preços aos usuários, e que o modelo de autorização é usado em outros lugares do mundo, comparando o país aos EUA, onde as ferrovias sempre foram privadas.

Segundo ele, somente o estado de Illinois, que produz cerca de 70 milhões de toneladas de grãos, tem 11 mil quilômetros de ferrovias operadas por 30 empresas. O Mato Grosso, que produz quantidade semelhante de produtos, tem 350 quilômetros e uma empresa.

Mortalidade
Os próprios servidores do ministério lembraram que nem todas as autorizações pedidas vão virar ferrovias, já que terão ainda que passar por outras etapas, como obter licenças e financiamentos. Em outros setores que utilizam o modelo de autorização, há um índice de mortalidade do projeto, que segundo Trinks está por volta de 20% a 30%.

Bruno Martinello, coordenador da secretaria responsável pelo setor de ferrovias no TCU (Tribunal de Contas da União), disse que levar a lógica privada para o setor traz riscos e oportunidades, que estão sendo mapeados pelo órgão de controle num processo específico.

Sobre um deles, a chamada compatibilidade locacional, que já é tema de uma representação em análise no órgão, Martinello disse que "não dá para ter dois traçados idênticos". Mas a primeira análise sobre o tema feita na secretaria foi de que o governo poderia autorizar projetos para a mesma região. A decisão final sobre o tema está em análise pelo relator do processo, o ministro Bruno Dantas.

Martinello afirmou ainda que o órgão de controle terá foco, entre outros temas, nos processos de adaptação dos atuais contratos de concessionários, que, tanto pela proposta da MP como do PL, terão que ter algum tipo de compensação ou até passar para o novo regime, em casos especificados por cada uma das propostas legislativas.

O auditor lembrou que, apesar de estar expresso que as adaptações só podem ocorrer quando novas ferrovias estiverem operando, portanto sem repercussão no momento, é preciso que as avaliações sobre o tema já comecem a ser feitas.

Desafios
O diretor-geral da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), Rafael Vitale, elencou esse ponto como um dos vários desafios que a agência terá que enfrentar para a regulamentação do novo marco do setor ferroviário. Além desse ponto, Vitale citou outros, como os critérios para a extinção das autorizações, para a desativação de trechos, expansão de malhas, investimentos de terceiros nas malhas e a autorregulação prevista na lei.

"Não temos respostas para tudo ainda. São conceitos novos que a gente precisa debater", disse Vitale.

O head of Logistics do Banco Santander, Rafael Mirandola, levantou pontos de risco que serão analisados pelos financiadores do projeto. Segundo o executivo, serão os principais pontos de risco a serem analisados pelos bancos. Dentre eles, o framework legal, o capex, o risco ambiental e as operações.

“O primeiro cuidado é o arcabouço legal, precisamos ter a certeza de não cancelamento das autorizações. A segunda parte é o capex. São três frentes, que são a parte física, material rodante e operação. Para os dois primeiros, temos um prazo bem alongado de construção além de investimentos vultosos. Tudo sem receita pingando até este ponto. O terceiro é área ambiental”, disse.