PROJETO DE LEI DO BR DO MAR É APROVADO NO SENADO, COM ALTERAÇÕES, E VOLTA PARA A CÂMARA
Tales Silveira, da Agência iNFRA
Em votação simbólica, o Senado aprovou, nesta quinta-feira (25), a redação final do PL (Projeto de Lei) 4.199/2020 – o BR do Mar. O texto da proposta do governo que havia sido votado na Câmara sofreu alterações e terá que ser votado novamente pelos deputados.
A proposta entrou na pauta do plenário do Senado na última quarta-feira (24), por meio de uma manobra do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O senador usou um projeto de lei que já podia ir ao plenário e tramitava em conjunto com o PL. Com isso, foi possível fazer com que o BR do Mar não passasse em comissões inicialmente previstas, como a CRA (Comissão de Agricultura e Reforma Agrária), onde estava, a CI (Comissão de Infraestrutura) e a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça).
O texto original foi enviado pelo governo em agosto do ano passado. Prevê que as EBNs (Empresas Brasileiras de Navegação) afretem embarcações a casco nu sem a necessidade de possuir navios brasileiros próprios, entre outras alterações. O governo afirma que, assim, será possível reduzir o custo do frete na cabotagem.
Além disso, o PL modifica a lei que dispõe sobre o AFRMM (Adicional do Frete para a Renovação da Marinha Mercante) e o FMM (Fundo da Marinha Mercante). O projeto iguala as alíquotas do AFRMM na navegação de longo curso, cabotagem, fluvial e lacustre, que passam de 25%, 10%, e 40%, respectivamente, para 8%.
Sem alterações
O novo substitutivo, disponível neste link, redigido pelo relator e líder do PSD, senador Nelsinho Trad (PSD-MS), não trouxe alterações em relação ao seu último parecer, aprovado na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado. Desde quarta-feira (24), quando o PL entrou na pauta do plenário, foram apresentadas mais seis emendas de plenário. Todas rejeitadas pelo parlamentar.
Ao todo, foram aprovadas 13 emendas na CAE, além das 22 sugestões que o relator já havia encampado em seu parecer. Entre as sugestões acolhidas, Trad atendeu parcialmente à emenda número 1, da senadora Kátia Abreu (PP-TO). Desta forma, foi retirado o limite de viagens por afretamento a tempo, desde que vinculadas a uma embarcação.
Ainda sobre o afretamento a tempo, o relator acatou a emenda 28, de autoria do senador Izalci Lucas (PSDB-DF), modificando a exigência mínima de tripulantes brasileiros nas embarcações afretadas – de 2/3 para 1/3.
Também aprovou a emenda 13, do líder do MDB, senador Eduardo Braga (AM), que mantém a alíquota de 40% do recolhimento do AFRMM para o transporte de granéis líquidos (combustíveis) na navegação fluvial e lacustre nas regiões Norte e Nordeste.
Trad acatou ainda a emenda 17, do senador Major Olímpio (PSL-SP), que morreu vítima de Covid em março deste ano. A proposta visa permitir o uso do adicional da AFRMM disponível na conta vinculada às EBNs para pagamento de salários durante a pandemia.
Em seu relatório, Trad adicionou a prorrogação do Reporto, que teve seu prazo encerrado em dezembro do ano passado. Em sua justificativa, o relator afirma que o desenvolvimento da navegação de cabotagem impacta diretamente a movimentação nos portos, que precisarão promover investimentos para acompanhar a nova demanda.
Governo comemora
A aprovação do BR do Mar no Senado foi comemorada pelo governo. Em suas redes sociais, o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, agradeceu ao relator. O ministro afirmou que a proposta trará um “avanço importante para o equilíbrio da matriz de transportes, redução do custo do frete e incentivo à indústria naval".
Em nota, o Ministério da Infraestrutura, disse que pretende ampliar o volume de contêineres transportados, por ano, de 1,2 milhão de TEUs, em 2019, para 2 milhões de TEUs, em 2022, além de ampliar em 40% a capacidade da frota marítima dedicada à cabotagem nos próximos três anos, excluindo as embarcações dedicadas ao transporte de petróleo e derivados. A expectativa é que o BR do Mar promova um aumento para 30% da participação da cabotagem na matriz logística do país.
Baixo frete
Para que o projeto fosse aprovado no Senado, houve uma forte pressão por parte de setores ligados ao agronegócio. O argumento utilizado é que a cabotagem tem o potencial de reduzir os fretes para cargas agrícolas.
De acordo com o diretor-executivo do Movimento Pró-Logística de Mato Grosso, Edeon Vaz Ferreira, o PL buscou atacar dispositivos que aumentam o custo do frete para o setor. Entre eles, a possibilidade de fretar navios estrangeiros mais baratos e diminuir gastos com tripulação e alíquotas do AFRMM.
“Estamos muito satisfeitos com o PL porque neste setor temos quatro grandes problemas. Três deles foram melhorados. A importação de navios, para aumentar a concorrência; a tripulação agora obedecerá às regras internacionais, e, portanto, terá um menor custo, e o AFRMM, que reduz o valor que o consumidor paga no frete. O quarto trata do combustível e, portanto, é uma questão estadual”, disse.
Críticas
Associações ligadas à cabotagem criticaram a proposta aprovada pelos senadores. De acordo com o diretor-executivo da Abac (Associação Brasileira dos Armadores de Cabotagem), Luis Fernando Resano, a proposta foi discutida superficialmente no Senado e fará com que o Brasil fique à mercê da variação dos preços internacionais.
“O PL desincentiva investimentos na frota de cabotagem e fará com que a frota nacional seja reduzida. Permitirá que embarcações usadas venham ao Brasil em total desigualdade de concorrência, uma vez que as empresas daqui investiram R$ 40 milhões por embarcação enquanto as outras não. A cabotagem vai continuar existindo de uma forma diferente e sem compromisso, de acordo com a volatilidade do mercado internacional. Espero que a economia consiga suportar”, disse.
A fala de Resano vai ao encontro das opiniões do diretor de Transportes Aquaviários da Logística Brasil, Abrahão Salomão. O empresário afirmou que a proposta não agrada a nenhum setor relacionado à cabotagem. Também disse que o modal será entregue a empresas estrangeiras sem interesses em investir no país.
“Infelizmente o nosso setor é largado. Depois irão reclamar dos preços de frete e que falta produto. A proposta não ataca o problema da concentração de mercado. Só quem apoia é quem não entende do setor. As alterações do Senado atenuaram o que era péssimo. As mudanças também foram muito tímidas e a proposta vai entregar a cabotagem ao pior estrangeiro”, afirmou.
Salomão disse ainda que o ministro da Infraestrutura prometeu que conversaria com a categoria e que diminuiria a pressão para aprovação da proposta. Contudo, segundo ele, tanto a associação quanto entidades ligadas à cabotagem não foram ouvidas e a pressão do governo para a aprovação continuou.
“Formalmente ele vem falando com a nossa associação dizendo que não é o dono da verdade e que iria nos ouvir após chegar de viagem do exterior. Afirmou que orientou o governo a parar de pressionar para nos escutar e elaborar um texto mais palatável. O que se viu é que isso não aconteceu. Tornaremos essas mensagens públicas”, informou.